Início Arte e Cultura por Adriana Sorgenicht Teixeira Jim Carrey e o livro do fim do mundo

Jim Carrey e o livro do fim do mundo

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Ator, comediante, roteirista, produtor e pintor canadense, Jim Carrey, conhecido por interpretar papéis cômicos em filmes como Ace Ventura, Debi e Loide, O Máscara, O Pentelho, O Mentiroso, Eu, Eu Mesmo e Irene, Todo Poderoso, Desventuras em Série e As Loucuras de Dick e Jane, agora é também um escritor que acaba de lançar seu primeiro romance – Memoirs and Misinformation (em tradução livre, Memórias e Desinformação, 288 páginas),  uma aventura satírica, uma ficção apocalíptica, metafísica e hollywoodiana, repleta de humor negro, detalhes autobiográficos e de sua carreira.

Escrito em colaboração com o romancista Dana Vachon ao longo dos últimos dois anos e lançado pela editora Knopf em 07 de julho passado, o protagonista do livro é homônimo da celebridade de múltiplas faces e começa enfrentando uma crise existencial e profissional, tentando escolher novos papéis principais, confinado em sua casa de Los Angeles e ao mesmo tempo assombrado com a perspectiva de que tudo tem um fim: sua própria vida e o universo. Nada mais atual. Abaixo alguns trechos da entrevista com Carrey e Vachon, que o site Terra traduziu (Anna Capovilla) e reproduziu este mês.

Como foi que vocês dois se conheceram?

Jim Carrey: Nós nos conhecemos há cerca de nove ou dez anos, quando o Twitter se tornou uma coisa extraordinária e as pessoas ainda experimentavam a plataforma.

Dana Vachon: Aquele inverno tinha sido realmente deprimente. Eu estava em Williamsburg, tudo estava fechando e todas as construções estavam paradas. E uma manhã, olhei o Twitter e Jim tinha tuitado “BOING”.

Carrey: Eu estava tentando criar outra versão da Força ou chi. A energia que torna tudo positivo no mundo.

Alguma vez você pensou em escrever um livro de memórias factuais da vida de Jim?

Carrey: Não há nada, a esta altura da minha vida artística, mais chato do que a ideia de escrever os fatos verídicos em ordem cronológica. Este é um trabalho de amor e nós não conseguíamos parar. Começou como uma espécie de jogo de vôlei, pará cá e para lá. E nos últimos anos foram oito horas. Doze horas de trabalho na maior parte dos dias. Mas, mesmo quando batíamos de frente, sempre conseguimos alguma coisa mais interessante do que havíamos concebido no começo.

O protagonista deste romance se chama Jim Carrey e ele teve uma vida muito parecida com a de vocês. Mas quem é ele?

Carrey: Jim Carrey, neste livro, é na realidade um representante – ele é um avatar de qualquer pessoa na minha posição. Do artista, da celebridade, do astro. Deste mundo com todos os seus excessos e a sua gula, autossuficiência e vaidade. Parte disso é muito real. Você só não sabe o que é o quê. Mas até as qualidades fictícias do livro revelam uma verdade.

Dana, como foi para você conhecer o verdadeiro Jim, em contraposição à versão que ele mostra na tela?

Vachon: Em uma das primeiras vezes em que tivemos contato, ele estava assistindo ao Dr. Jekyll e Mr Hyde, de John Barrymore, que constituem o eixo da história. Ele me disse: “Veja Barrymore”. E eu pensei: “Puxa, Jim Carrey assiste muito à Netflix”.

Carrey: Houve momentos em que eu fiquei com muito medo. Eu vejo John Lennon numa maca no YouTube. E piro completamente porque me dou conta de que as pessoas irão tirar selfies de mim quando for o meu corpo. Alguém irá olhar para a cena como se fosse uma novidade. Esse terror e o medo mortal de querer ser um cadáver bonito fez com que eu fosse ao banheiro para me maquiar antes de ir para a cama porque se eu morresse no meio da noite, seria apresentável para um público que me adora.

Houve algum momento em seu processo de criação em que Jim disse que você está levando as coisas longe demais ou nós não podemos chegar a tanto?

Vachon: Estava falando com Nic Cage uns dias atrás. Não havia contado nada do livro para ele e então um dia eu contei sobre isso (voz de Nicolas Cage): “Jim, fico muito honrado, cara. Você nem imagina”. Eu disse: “Dei pra você as melhores falas”. (voz de Cage): “É uma coisa inaudita!” Ficou muito emocionado com isso.

Vocês contaram às outras celebridades às quais vocês se referem com o nome delas que elas são personagens do livro?

Carrey: Estamos enviando para todas elas livros com uma carta explicando o que estamos fazendo.

Jim Carrey e o livro do fim do mundo

Vachon: “Querida Gwyneth” (Paltrow).

Carrey: É uma sátira e uma paródia, mas também é feita com muito respeito. A maioria das pessoas neste livro é gente que eu admiro muito.

Isso, por acaso, inclui o personagem que você, por razões legais, diz que mencionará apenas como “Laser Jack Lightning”?

Carrey: Só estamos brincando com as brigas em Hollywood. Conheço Tom Cruise. Talvez ele me dê um soco, mas puxa, vou levar o soco como uma obra de arte. Acho que ele vai adorar.

Dana, houve alguns momentos em que este projeto pareceu como uma versão na vida real de Crepúsculo dos Deuses?

Vachon: Totalmente. Barton Fink: Delírios de Hollywood foi o que mais me viria à lembrança. Mas quando comecei a me preocupar, já era tarde demais.

Carrey: Não foi tanto assim.

Vachon: E além disso, nem foram oito anos de trabalho no total. Nós, na realidade, trabalhamos duro, intensamente, nos dois últimos. É que estávamos sempre envolvidos em outras coisas.

O livro retrata de maneira muito vívida a intensa frustração do seu protagonista em relação a Hollywood e ao seu distanciamento do seu trabalho e das suas realizações. Jim, até que ponto isso representa seus sentimentos reais?

Carrey: O Show de Truman não foi um erro. Eu sou um cara que um dia de repente olhou para cima e começou a ver toda a máquina e as luzes descendo do céu. Todo projeto é um pouco de mim mesmo no processo de me recriar. Rasgando o antigo ser e explorando algo novo. Toda a minha carreira. Eu pedi muito ao meu público, e ele me deixou fazer estas coisas. Acho que ele espera isso de mim, de certo modo. Ele não espera algo convencional.

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